A pandemia ensejou as mais diversas crises em toda a humanidade, partindo de milhões de vidas ceifadas – as perdas mais significativas – e chegando a todos os setores imagináveis da economia. Não creio que os efeitos e sequelas deixadas serão dizimados ou até minimizados em curto período.

Dentro do tema, inegável que o ramo automóvel é o mais popular e o de comercialização mais intensa, até porque, diz a publicidade, “brasileiro não vive sem automóvel”; e não é uma exclusividade nossa, à evidência, a pasta auto é largamente vendida no mundo todo.

Aqui o efeito bomba foi na indústria automotiva que recepcionou em cheio as consequências, que já perduram por mais de dois anos.

São repetitivas as notícias de falta de peças e paralisações de montadoras, por isto, como acontece com Fiat, VW, GM, havendo atrasos e parada na produção, tudo vinculado diretamente a lockdowns na China que multiplicam o problema. É grave.

Com o mercado aflito, os reparos nos veículos acidentados sofrem estupendos atrasos tirando a paciência e a tolerância de um consumidor que já vem sendo castigado, faz muito, com todo o tipo de abuso, inflação descontrolada – quem frequenta super mercado e farmácia sabe disto – com disparada de preços violenta, e prestação de serviços cada vez mais carente: em suma, o consumidor está um barril de pólvora com um pavio pronto para ser aceso diante qualquer deslize. Neste passo a indústria do automóvel sofre com baixa produção e preços altos o que indica afastamento da procura. Grave, de novo.

Neste furacão, o setor de seguros não só se vê atingido pelas dificuldades naturais, de comércio de apólices, como pior, o atendimento no sinistro passou a ser trágico. Quem suporta esperar 40, 50, 60 dias ou mais sem reclamar. Nem eu.

Que é o responsável por tudo isto? Quem tem que pagar por isto?

A questão parece simples.

O seguro deve pagar os prejuízos destes atrasos!

É o primeiro pensamento que assalta o universo consumidor, afinal, se paga seguro para não se incomodar – ainda há quem pense exatamente assim. As montadoras, que são as ´responsáveis` pelos atrasos? O Governo? Quantos mais?

Ou nós ainda pagamos também por isto?

Penso que antes de mais nada é preciso uma reflexão profunda sobre o que pensamos sobre danos e responsáveis.

Sempre que há um dano causado nos postamos na qualidade de vítimas, ou seja, nós somos o prejudicado. Nunca pensamos ou nos colocamos no lugar do agente ativo do dano e que eventualmente podemos ser. Num acidente automobilístico a rápida, e em regra, simplista, definição da vítima é a de que o causador paga tudo – não descarto que isto possa a ser regra, e talvez deva efetivamente ser. Mas tudo o que cara pálida? Tudo o que for responsável, parece que seja este o sentimento de justiça que aprendemos como defensores da lei ou da justiça, seja por aprendizado nas universidades seja pela formação familiar. Isto também pode-se dizer que é regra.

Nos elementos caracterizadores da culpa encontramos a negligência, a imprudência e a imperícia. A presença de um deles é suficiente para apuração da culpa, em sua área subjetiva. Mas não podemos esquecer que a obrigação de indenizar só se concretiza com a presença integral de três outros requisitos: o fato lesivo, o dano causado e o nexo causal.

Me pergunto, qual seria o nexo causal existente entre o fato caracterizado como culposo, praticado por usuário de um automóvel, e o retardo na liberação do veículo pela falta de peças?

Ao invés de nos colocarmos como vítimas, sempre, em situações do tipo – sofremos uma colisão com culpa de outrem – que tal encararmos isto como provocadores do evento danoso? E então vamos repetir a pergunta: seremos responsáveis pelos retardos e suas consequências nos reparos do veículo prejudicado?

É a mesma indagação que lanço nesta reflexão: seria o segurador responsável por uma indenização em seguro de RCF por dano causado por seu segurado sem que o nexo causal se estabeleça?

E no ramo AUTO? Estaria ao abrigo da cobertura do contrato o retardo que não foi ocasionado por desídia da seguradora?

Não me parece estar ao alcance da lei, e muito menos ser tido como justo, que questões alheias à atividade do agente ativo do dano e ou estranhas ao contrato sejam consideradas ao alcance da responsabilidade de ambos.

Me parece, ao contrário, que no que respeita ao agente do dano e ou ao seguro vigorem as excludentes de reponsabilidade, afastando o dever de indenizar. É, sub judice, a minha opinião, destacando que na Pandemia as empresas de seguro, em maioria maciça, num ato de coragem e humanitário, deixaram de considerar a cláusula excludente.

*Carlos Josias Menna de Oliveira– OAB/RS 16.126

É advogado, professor diplomado, Acadêmico da ANSP e membro da Cátedra de Seguro de Danos: RC da Academia Nacional de Seguros e Previdência – ANSP.

 

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