A previsão de ocorrência do fenômeno El Niño no período de plantio da soja safra 2023/2024[1], possivelmente trazendo alterações climáticas significativas como excesso de chuvas, tempestades e/ou chuvas de granizo durante o período da semeadura, especialmente no Sul do país, poderá ensejar a necessidade de o produtor replantar em decorrência de danos.

O mercado de seguros possui produtos que ofertam garantia adicional para este período de plantio, germinação e emergência – momento anterior à cobertura do seguro agrícola tradicional, quando as plantas alcançam 15 cm de altura.

Cobrindo fenômenos climáticos específicos e restritos[2], tal cobertura adicional pode alcançar ao segurado indenização que lhe permita justamente replantar. Semear novamente.

Porém, tal replantio deve ser realizado ainda dentro da janela prevista no ZARC (Zoneamento Agrícola de Risco Climático), observando a melhor técnica e orientação do Ministério da Agricultura, e respeitando condição contratual para a hígida vigência da cobertura básica da apólice de seguro agrícola – proteção dada durante a vida da planta, com critérios específicos de marco inicial de cobertura conforme cultivar. Em outras palavras, ou o produtor replanta respeitando o ZARC, ou qualquer sinistro que ocorra na lavoura dali em diante não terá cobertura.

Imaginando cenário de alta sinistralidade na época de semeadura, impõe-se o primeiro desafio para as seguradoras. Serão inúmeras e necessariamente ágeis as vistorias a campo para verificação da causa de cada sinistro e a aferição dos prejuízos, para então determinar indenização[3] com fulcro na cobertura adicional de replantio. A pressa na verificação é para que o segurado ainda tenha tempo de replantar dentro do Zoneamento.

O segundo desafio das seguradoras é, através de monitoramento através de satélite ou outra forma eficaz, constatar se a lavoura foi efetivamente replantada e se dentro da janela (ZARC) que é condição da aceitação do risco – no caso das apólices subvencionadas, condição imposta também pelo MAPA. Tarefa que requer emprego de tecnologia, importante investimento em equipes de peritos e longos deslocamentos. Sim, o produtor deve respeitar o contrato e inclusive avisar se replantou e quando. Mas nem sempre o segurado observa esta conduta.

Se e ao constatar que o replantio se deu fora do prazo previsto no ZARC, os departamentos de sinistro devem ter visão jurídica do impasse. Evitando discussão futura, é aconselhável notificar o segurado para resolver o contrato, incluindo repercussões com relação ao prêmio recolhido. Trata-se de importante medida para prevenir discussões por sinistros ocorridos na sequência e durante a irregular[4] vigência da cobertura básica, inclusive avisados mais próximos da colheita. Justificar a resolução do contrato por desrespeito ao ZARC, já logo após a nova semeadura, mostra-se na prática mais eficaz para a proteção da seguradora. De outro lado, alegar a infringência contratual pelo segurado ao final da safra trará necessário e maior esforço na obtenção de provas do desrespeito ao ZARC em eventual enfrentamento judicial.

As visões jurídicas e técnicas do seguro devem andar juntas, em nome da harmonia contratual e da segurança jurídica de todos.

[1] https://www.segurogaucho.com.br/noticias/interna/el-nino-gera-incertezas-para-a-safra-de-graos-2023-24-20326?uf=RS

[2] A seca é risco excluído, justificadamente.

[3] Algumas seguradoras realizam a vistoria e depois trabalham com reembolso ao produtor das despesas que este comprove que teve com o novo plantio.

[4] É condição para a cobertura o respeito ao ZARC

 

*Juliano Ferrer

Advogado graduado pela PUC/RS em 1995, possui MBA em Gestão Jurídica de Seguro e Resseguro pela Escola de Negócios e Seguros – ENS. É sócio do Escritório CJOSIAS & FERRER ADVOGADOS ASSOCIADOS, e professor da cadeira de Direito da Escola de Negócios e Seguros – ENS desde o ano 2000. É Presidente da AIDA BRASIL, integrante da Comissão de Seguros e Previdência Complementar da OAB/RS. Membro da Cátedra de Agronegócio da ANSP.

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