Fui assistir um filme chamado “Abutres” realizado na Argentina por Pablo Trapero e que trata especificamente de fraude contra o seguro DPVAT, e que, por isso, transforma “Abutres” em um triller de relevância social.

Posso dizer que depois de muitos anos lidando com esta praga, o assunto , a forma e tudo o que se relaciona a fraude é igual em todos os países.O filme, na realidade, trata da consciência de um advogado que inventava, criava e ia até as últimas consequências visando receber a indenização da seguradora, mas ao se apaixonar por uma médica resolve agir corretamente e aí aparecem as consequências de se envolver com pessoas inescrupulosas.

O filme denuncia uma máfia que arrola advogados, médicos, enfermeiros, ambulâncias, polícia, com o intuito de fraudar as seguradoras, e isto motivou o Congresso Argentino a discutir mudanças na legislação de seguros para acidentes de automóvel.

O planejamento ia de criar situações que levavam o advogado a tentar receber o devido e o indevido das seguradoras. Eram chamados de Abutres pela polícia, pelos médicos e funcionários de hospitais. Criava-se acidentes, buscava-se com procurações receber altas somas de indenização e repassavam um valor mínimo para o acidentado ou para a família em caso de falecimento.O roteiro, assinado por Trapero e outros três escritores, revela qual a real função do personagem Sosa: dar assistência a pessoas que dão golpes em seguradoras.

O próprio advogado quebrava a perna do individuo com uma marreta, depois ele era atropelado por um carro fazendo com que o acidente tivesse proporções gigantescas e às vezes ao ponto de acontecer o falecimento do individuo.

Iria tudo bem, se o caminho dele não cruzasse com Luján (Martina Gusman), uma paramédica que socorre vítimas de acidentes automobilísticos.

O advogado, ao tentar sair deste esquema de corrupção, dentro de um clima de suspense ganha contornos da disputa entre advogados e o embate entre Sosa e Luján, quando ela desconfia que seu novo namorado não é lá muito idôneo, então, a máfia entra em ação e, através da violência, consegue manter o advogado no esquema sob pena de ser morto.

O filme retrata com realismo o mundo caótico em que vivem estes abutres. Espancam médicos, pessoas ficam reféns destes indivíduos inescrupulosos que manipulam e influenciam desde um simples motorista de ambulância até um policial corrupto. Às vezes a ambulância ia atender um chamado que não existia oficialmente mas ele já tinha conhecimento e em poucos minutos estava no local.

Na realidade este esquema de fraude contra as Companhias no seguro obrigatório é bastante rendoso no Brasil e em outros países que adotam o mesmo tipo de cobertura.

“Abutres” parece uma espécie de primo latino de “Crash – Estranhos Prazeres”, de David Cronenberg, lançado em 1996 e que provocou protestos na Argentina por parte da “Associação das Vitimas de Acidentes de Trânsito”, que conseguiu tirá-lo de cartaz em Buenos Aires. Aqui, no entanto, ao contrário do longa canadense, baseado em J.G.Ballard, as batidas de carro não são formas de fetiche, mas praticamente ferramentas para movimentação de forma ilícita, da economia.

A fraude é sem dúvida alguma uma erva daninha que precisa ser extirpada. Pratica-se fraude no seguro de automóvel, nesta modalidade em grande escala, nos seguros de pessoas onde encontramos desde morte premeditada até assinaturas falsificadas, idades modificadas e uma infinidade de meios de tentar fraudar as seguradoras.

Fraude no seguro de transporte, em incêndio com casos até pitorescos já mencionados por mim em outros artigos. É evidente que o grande problema das seguradoras é provar a fraude, já que indício a Justiça brasileira não aceita.

O nosso principal problema é na contratação do seguro onde deixamos escapar perguntas e informações que fatalmente inibiriam a prática de fraude. A nossa passividade em relação ao problema é outro entrave para acabarmos com esta erva daninha. As seguradoras normalmente preferem encerrar o sinistro a abrir um processo criminal contra o individuo ou indivíduos.

Quem sabe uma hora nós conseguimos também realizar um filme mostrando os malefícios da fraude, o que ela representa e o que ela traz de negativo para o segurado, a seguradora e ao próprio mercado de seguros.


Lucio Marques

Diretor Comercial da Previsul
Membro da Academia Nacional de Seguros e Previdência – ANSP
Lucio@previsul.com.br