Fui convidado a participar de um painel internacional de debates sobre o futuro da indústria de seguros no mundo pós-Covid-19. Pesquisei muito sobre o assunto, buscando fontes em publicações específicas sobre o mercado segurador e de tecnologia, bem como referências de ordem geral, extrapolando a visão setorial apenas. Tive acesso a materiais riquíssimos, cujas referências listo ao final desse texto.

Após uma boa dose de reflexão, concluí algo que me surpreendeu: o futuro do mercado de seguros no Brasil pós-Covid-19 será muito promissor!

Tendemos a ter visões mais sombrias sobre o por vir, ainda mais num momento tão complicado como o que estamos vivendo. Uma grande dose de pessimismo e negativismo parece ser a norma. No entanto, não é assim que estou vendo a situação e trago a seguir, elementos que justificam esse otimismo. De certa forma, posso dizer o mesmo com relação ao futuro do país, talvez com um pouco menos de otimismo, pois serão necessárias uma série de ações para que o Brasil possa se posicionar como uma das nações com um futuro positivamente esperançoso.

Focarei na indústria de seguros neste texto, deixando uma análise sobre o Brasil para outro artigo.

Trago evidências para embasar minha visão positiva. Sou o fundador e CEO de Minuto Seguros, empresa pioneira na venda de seguros através de plataforma online, com suporte de atendimento humano. Desde o início de nossa operação em 2011, temos as vendas de seguro de automóvel como o principal produto em nossa grade de oferta. Imaginava-se no começo da década passada que a oferta online faria com que a venda de outros seguros decolasse no Brasil. Não foi o que aconteceu. Apesar de também encontrarmos demanda por seguro de carro no ambiente online, a questão da baixa penetração de outros seguros no Brasil não está relacionada à forma como são vendidos, mas sim a uma questão cultural. Para piorar o cenário, passamos a ouvir que os dias do seguro de automóvel estavam contados em função de inúmeros fatores: chegada da economia do compartilhamento e da mudança do hábito da sociedade com relação a mobilidade (bicicletas, patinetes); de empresas como Uber e aplicativos de táxi; veículos autônomos; veículos por assinatura entre outras ameaças existenciais como o próprio conceito de propriedade do veículo.

A chegada da Covid-19 colocou em evidência uma reversão de tendência não só com relação ao automóvel – conforme explicarei no próximo parágrafo – como também com à casa, a vida, a saúde e à empresa. Em função da pandemia, notamos na Minuto um crescimento muito significativo na demanda e nas vendas de seguros que tradicionalmente o brasileiro não dá importância. Para as pessoas físicas, as vendas de seguros de vida dispararam 136% quando comparamos março de 2019 com 2020. A procura por termos relacionados a proteção financeira aumentaram 157% de fevereiro a março de 2020 de acordo com estudo do Google. As vendas de seguros residenciais estão em trajetória ascendente. Com relação aos seguros empresariais, apesar de ver a queda na busca de proteção patrimonial, percebemos o crescimento da demanda por seguro de vida em grupo, com um aumento de 250% em março de 2020 na comparação com o mesmo mês do ano passado.

A pandemia e a necessidade de distanciamento social fizeram com que o automóvel, sobre o qual o proprietário tem total controle em questões de higiene, passasse a ser um dos meios de transporte mais seguros. Além disso, o carro limita a necessidade de interação que é inevitável no transporte público. A queda no preço do petróleo fará com que o preço da gasolina também seja impactado (pelo menos em mercados desenvolvidos), tornando a utilização do automóvel particular ainda mais atrativa. Sabemos que a indústria automotiva é grande fonte geradora de empregos no Brasil e muito provavelmente o governo, para incentivar a retomada econômica, terá que exercer apoio à indústria para recuperar postos de trabalho e gerar renda para essa massa de trabalhadores. A taxa de juros em um dos patamares mais baixos da história do país também é um fator que irá colaborar com o financiamento à compra de veículos. Essa conjunção de fatores é extremamente positiva para a venda de seguros de automóveis.

Podemos pegar carona nesta lógica para endereçar a questão das vendas de seguros residenciais. Assim como a indústria automotiva, a construção civil é grande empregadora no Brasil. Com a taxa de juros em patamares muito baixos e a retomada do financiamento habitacional, aliada à mudança forçada – mas bem aceita e absorvida – do trabalho em home office, podemos ter um boom na venda de imóveis. Percebemos na Minuto um crescente interesse pelo seguro residencial, não apenas por atributos tradicionais do produto (como a cobertura contra roubo, incêndio, danos elétricos) mas também pela ampla gama de serviços que são atrelados à apólice, como: serviços de eletricista, encanador, chaveiro e até help desk (suporte com relação a problemas com computadores e internet), etc. Esses serviços ganham grande relevância quando passamos a trabalhar em casa, tendência que veio para ficar. Em paralelo, temos os seguros para equipamentos eletrônicos, como computadores, celulares e tablets, sem os quais não conseguimos trabalhar, consumir e nos entreter na nova ordem digital do mundo. Sinais dos novos tempos de digitalização não só da economia, como de nossas vidas.

Interessantemente, percebemos a surpresa dos clientes ao se depararem com as cotações dos seguros de casa e de vida. Os preços são invariavelmente muito inferiores à percepção que eles têm a priori, pois as pessoas em geral têm como parâmetro de comparação o seguro de automóvel, que custa em média 4% do valor do veículo. Seguros de residência e de vida custam uma pequena fração desse valor.

É importante ressaltar, entretanto, que nem todos os ramos da indústria de seguros devem ter bons resultados após a Covid-19 e seus impactos na atividade econômica. Seguros como de viagem, lucros cessantes, eventos, fiança locatícia, aéreo, de crédito e para pequenas e médias empresas, por exemplo, devem sofrer. Vários destes estarão sujeitos a discussões judiciais e outros sofrem diretamente o impacto da necessidade de distanciamento social.

Com relação aos seguros para empresas, temos boas e más notícias. Pelo lado das boas, notamos um crescente interesse por apólices de seguro de vida em grupo e de saúde, diretamente relacionadas à percepção de riscos de morte e de doença escancarados pela Covid-19. A oferta deste tipo de benefício, se já era importante, passa a ser fator decisivo para conseguir atrair talentos para uma empresa nos dias de hoje. Com relação aos seguros patrimoniais empresariais, temos produtos que cobrem aspectos relacionados ao trabalho em home office, que veio para ficar. Pela ótica negativa, temos visto a redução do mercado potencial para venda de seguros para empresas, em função do significativo aumento no volume de negócios que estão fechando ou irão fechar as portas dada a grave crise econômica.

A retomada do crescimento econômico muito provavelmente passará por investimentos do governo em infraestrutura e parcerias com a iniciativa privada para este fim. O mercado de seguros possui uma gama de produtos adequada para suportar essa atividade econômica, como seguros de garantias de obrigações contratuais entre outros.

Não menos importante, pelo contrário, nesta nova era da economia digital que tantos benefícios traz às empresas e às pessoas, passamos a correr riscos de ataques cibernéticos. O tema do roubo de bases de dados, invasão de privacidade, sequestros eletrônicos, entre tantos outros crimes virtuais, passou a fazer parte das conversas diárias. Existem seguros específicos para este tipo de risco e muito provavelmente terão um boom de vendas. Apesar do mercado imobiliário corporativo para escritórios poder vir a sofrer com a recessão e com a migração de parcela do trabalho para home office, o mercado de imóveis corporativos para atender a economia digital deverá ir na direção contrária. Existirá demanda para armazéns de distribuição e data centers.

A pandemia trouxe incertezas e tornou evidente a necessidade de planejamento para diferentes cenários. O seguro se encaixa perfeitamente como um elemento que reduz o risco e traz no seu bojo toda proteção necessária para enfrentar os infortúnios da vida.

O mercado de seguros no Brasil tem um potencial enorme. A parcela de pessoas e empresas que possuem algum tipo de seguro é muito pequena, na média talvez menos de 20%. Dado todo o cenário que tracei, atrelada à baixa penetração dos seguros na sociedade, acredito que tenhamos um futuro promissor.

 

Fontes:

Covid-19 Investment Implication Series: The World After Covid Primer – Thematic Investing – BofA Global Researche – May/20. https://www.bofaml.com/content/dam/boamlimages/documents/articles/ID20_0467/the_world_after_covid.pdf

Gavekal Research – The Upside For Autos and Housing – Ideas May/20 https://research.gavekal.com/article/upside-autos-and-housing

Coronavírus – O mundo nunca mais será o mesmo – Google IAT (Integrated Analytical Team) – Insider Report – Abr/20

Global Insurance: Why tech is a game-changer – Fev/20 https://www.polarcapital.co.uk/gb/professional/Investment Insights/Post/3291/Global_Insurance_why_tech_is_a_gamechanger

2020 Predictions – Jan/2020 https://medium.com/lightspeed-venture-partners/2020-predictions-4ab729d7579c

The Future 100 2.0.20 – A Report by Wunderman Thompson Intelligence – Apr/20 https://intelligence.wundermanthompson.com/trend-reports/the-future-100-2-0-20/

World Insurance Report 2020 – Capgemini Research Institute – Efma https://www.capgemini.com/news/world-insurance-report-2020/

The Car Is Staging a Comeback, Spurring Oil’s Recovery – Mai/2020 https://www.bloomberg.com/news/articles/2020-05-10/the-car-is-staging-a-comeback-spurring-oil-s-recovery

 

*Marcelo Blay

É fundador e CEO da Minuto Seguros e vice-coordenador da Cátedra de Canais de Distribuição.

 

 

Esta publicação online se destina a divulgação de textos e artigos de Acadêmicos que buscam o aperfeiçoamento institucional do seguro. Os artigos expressam exclusivamente a opinião do Acadêmico.

Expediente – Diretor de Comunicações: Rafael Ribeiro do Valle | Conselho Editorial: João Marcelo dos Santos (Coordenador) | Dilmo Bantim Moreira | Felippe M Paes Barretto | Homero Stabeline Minhoto | Osmar Bertacini | Produção: Oficina do Texto |Jornalista  responsável: Paulo Alexandre | Endereço: Avenida Paulista, 1294 – 4º andar – Conjunto 4B – Edifício Eluma – Bela Vista – São Paulo – SP – CEP 01310-915| Contatos: (11)3335-5665| secretaria@anspnet.org.br  | anspnet.org.br |